quarta-feira, setembro 07, 2005

E são 31... os campos de golfe!

«Para regar os 31 campos de golfe actualmente existentes no Algarve é necessário um volume de água equivalente ao consumo de uma cidade com 240 mil habitantes - ou seja, cerca de 60% da população residente na região -, indica um estudo universitário. Numa fase em que se agrava a escassez de recursos e 75% do território nacional está em situação de seca extrema, os ambientalistas apontam o dedo à dependência excessiva dos empreendimentos em relação a captações subterrâneas, enquanto a associação representativa dos empresários minimiza os gastos e salienta estarem em curso medidas de poupança.

"Este ano a procura dos campos de golfe algarvios aumentou cerca de 10%, mas isso não se reflectiu nos gastos de água", acentua Elidérico Viegas, presidente da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA). "Aliás, conseguimos atingir cerca de 30% de redução nos consumos da população flutuante e 40 a 50% nos campos de golfe".

O dirigente associativo considera "estranho" que os olhares se centrem na factura do golfe, quando o sector agrícola é o que mais água absorve no Algarve - 73 a 75%, de acordo com variados estudos da universidade da região e de organismos oficiais. "Se compararmos a rentabilidade de um campo de golfe com a de idêntica área de regadio, não faz sequer sentido colocar o primeiro como mau da fita", sustenta Elidérico Viegas.

Argumentos que não convencem a Almargem, que salienta o facto de os empreendimentos se concentrarem no eixo Albufeira-Loulé-Faro, "precisamente onde há maior escassez de recursos hídricos e onde a precipitação é menor". A associação ambientalista contesta igualmente a fatia do bolo atribuída ao sector agrícola, considerando que muitas áreas avaliadas nos estudos oficiais estão já abandonadas e que a rega de citrinos se realiza actualmente "de forma muito mais eficiente do que nos golfes, por recorrer a sistemas de gota-a-gota".

Estações próprias


Carlos Cabrita, responsável da Almargem para a área dos recursos hídricos, lembra que só uma pequena minoria dos campos usa águas superficiais, recorrendo a protocolos com as associações de regantes. Por outro lado, apenas um recorre exclusivamente a água residuais tratadas e são poucos os que usam esse sistema como complemento, apesar de investimentos em estações próprias feitos, nalguns casos, "com financiamentos públicos".

Essa é uma das falhas detectadas num estudo sobre o golfe efectuado, no ano passado, pela Universidade do Algarve, que aponta igualmente a necessidade de serem aplicados sistemas de rega mais adequados, em alternativa ao comum - por aspersão. O documento indica soluções técnicas que poderiam reduzir os gastos de água, identificando "diferenças tecnológicas consideráveis ao nível do controlo da rega" nos campos analisados. A título de exemplo, refere que apenas quatro dispunham de estação meteorológica para ajudar no cálculo dos parâmetros de rega.

Além de considerar "crítico o facto de a origem do abastecimento" depender excessivamente da captação de águas subterrâneas, o estudo aponta outro risco a salinização do solo e consequente contaminação dos aquíferos, particularmente "vulneráveis à contaminação salina quando se situam no litoral, devido a avultadas captações aí efectuadas".

Factores identificados, de resto, na generalidade dos estudos de impacte ambiental, que apontam consequências negativas e de carácter permanente no plano da hidrogeologia e dos recursos hídricos superficiais. Até porque, da área total ocupada pelos campos em funcionamento, 71,7% está sobre sistemas aquíferos.

A somar a todos estes impactos, a Almargem acrescenta o facto de o golfe ser cada vez mais "um negócio imobiliário" e de os turistas "consumirem, em média, 440 litros de água por dia, contra os 250 da população residente". Números que "podem mesmo atingir os 880 litros, se contabilizarmos as piscinas e outras comodidades auferidas pelos turistas que praticam golfe".

Elidérico Viegas concorda que o golfe é uma indústria (que gasta, aliás, mais do dobro de água do sector industrial da região), mas no sentido economicamente positivo do termo "É uma indústria pela riqueza que gera e pelos bens que atrai".»

manchete do Jornal de Notícias, 5 de Setembro de 2005

Não são propriamente os campos de golfe do Algarve e a água que gastam que me assustam, mas sim a inércia de quem pode e não faz nada para se usarem soluções adequadas de forma a poupar a pouca água que ainda nos resta. Se não começarmos a ser conscientes hoje, que futuro se avizinha amanha?